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Arquivo de categoria Área de Serviços

PorMarco Aurélio Medeiros

Iniciativa sem “acabativa” vale pouco

Pedro Álvares Cabral saiu de Lisboa em 9 de março de 1500 comandando 13 navios e 1.500 homens. Ele tinha duas missões: (i) a mais importante, consolidar o poder de Portugal na Índia; era a segunda expedição enviada por Dom Manoel, e a primeira tinha sido a descoberta do caminho por Vasco da Gama; e também (ii) descobrir oficialmente o que hoje se conhece como o Brasil, já que o mesmo ficava no caminho para a Índia: por conta das correntes marítimas contrárias, as caravelas, movidas a vento, não conseguiam margear a costa da África, precisavam fazer uma rota semicircular que passava pelo Brasil.

Aportou no Brasil em 22 de abril de 1500, ficou por aqui 9 dias, e seguiu para a Índia, chegando em Calicute em 13 de setembro de 1500. Só retornou a Portugal em 21 de julho de 1501. Chegou destruído em Lisboa, com apenas 500 homens e 6 navios. Em Calicute foi preso, feito refém, e não alcançou os objetivos previamente definidos pelo rei.

Apesar da festa inicial quando do seu retorno, depois dessa viagem foi condenado ao ostracismo, e morreu esquecido na sua vila de nascimento, sem ter participado de nenhuma outra expedição.

Em resumo: ficou no Brasil 9 dias apenas, e mais de um ano na Índia. Hoje é lembrado pela tarefa que terminou, não pela que ficou pela metade.

Também funciona assim nas empresas: se alguém de muita iniciativa começa 10 projetos, trabalha 12h por dia nessas tarefas, e ao final de um ano só encerrou 2, todo esse trabalho se resume a unicamente 2 escassos projetos. O que fez nos outros 8, se ficou pela metade, vale muito pouco.

Pessoas de muita iniciativa, e pouca “acabativa”, valem pouco. O bom profissional tem iniciativa, e conclui tudo o que assume. 

Essa é uma reflexão para operadores, e sobretudo para gestores. Os profissionais de iniciativa fazem um sucesso inicial, até porque, leva algum tempo para que os projetos/tarefas sejam (ou não) concluídos. Como o gestor não pode perder tempo, o ideal é dosar, segurar um pouco o ímpeto inicial do colaborador e dar foco em algumas poucas tarefas no começo, a fim de ver a conclusão acontecer. 

Provado que o profissional tem também a tal “acabativa”, maravilha, deixa ele abraçar o mundo e se desenvolver sem amarras: pessoas boas não podem ser tolhidas. Por outro lado, se começar a encontrar desculpas, ou tentar assumir um projeto novo para não terminar o anterior, vale ligar o alerta.

PorMarco Aurélio Medeiros

Empresas em dificuldades: discussão de dívidas bancárias, defesa de execuções fiscais e outras saídas criativas

No Brasil, emendamos sempre uma crise na outra, e de vez em quando uma catástrofe se instala nas finanças de algumas empresas.

Falo de dividas bancárias, dívidas tributárias, débitos com fornecedores, execuções fiscais, ações de despejo, ações trabalhistas, dentre outros traumas. Se a sua empresa está nessa situação, e ainda funcionando, eu tenho uma boa notícia: você vai sobreviver!

É possível administrar esses problemas, e ainda tocar o seu negócio.

Vou tratar aqui de algumas soluções, mas elas não são as únicas, nem esgotam o tema. Em qualquer caso, é o planejamento caso a caso que resolve o problema. Quero aqui lhe dar uma boa ideia de pontos de partida, insights que ajudam a abrir a mente para o caminho que se deve tomar.

Dívidas bancárias

Em relação aos bancos, a orientação é sempre discutir judicialmente a dívida. O seu gerente, gente boa, amigo de muitos anos, tem margem quase zero para negociar seu débito.

Por outro lado, cobranças indevidas são comuns na relação com os bancos. Taxas não contratadas, juros acima do mercado, venda casada de serviços (aquele seguro que empurram goela abaixo para aprovar uma conta garantida), dentre outras irregularidades.

Prova disso é que, nas brigas judiciais, são comuns acordos para pagamento de valores em até 10% do débito original. Isso mesmo: há casos em que se quita a dívida tão somente com 10% do seu valor inicial. O seu gerente não consegue nada nem perto disso…

O caminho é o seguinte: reúna todos os seus contratos bancários e os extratos dos últimos cinco anos. Se não tiver em mãos, peça ao banco. Em seguida, mande a documentação para um perito contábil analisar, e já fazer o cálculo dos valores indevidos. Já vi casos em que essa conta deu valor negativo: o banco que devia ao correntista.

De posse do laudo, é o caso de ajuizar. Ao juiz pede-se liminar para suspender a cobrança: se o laudo apontar algum valor devido, vale a pena oferecer uma garantia; isso faz o juiz enxergar a sua boa-fé. E com a liminar, o Banco senta para negociar em outras bases.

Fora que à medida que o tempo passa, a sua dívida é lançada como perda no balanço do Banco, e se transformando em economia tributária: só aí, ele já ganhou quase 50% do seu débito, pois a alíquota de IR de instituições financeiras é alta. A partir daí, qualquer valor que ele recuperar já é vantagem, e os acordos ficam mais fáceis de acontecer.

Dívidas trabalhistas

Vamos falar agora dos funcionários. O débito trabalhista é um dos poucos que atingem a pessoa física dos sócios de forma direta, então tome muito cuidado com ele. Por outro lado, vejo muita gente aumentando o passivo trabalhista porque não tem dinheiro para demitir o funcionário. Isso não tem sentido.

A penalidade por demitir um funcionário e não pagar as verbas rescisórias é de um salário recebido por ele, conforme previsto no artigo 477 da CLT. Exemplo: se o funcionário recebe 2mil por mês, é demitido sem que as verbas sejam pagas no prazo, o empregador ficará devendo, além das verbas que não pagou, mais 2mil reais.

Agora, se não demito porque não tenho dinheiro, não fico pagando 2mil reais a cada mês que passa?

Ora, se realmente não preciso do funcionário, melhor demitir, ainda que não se tenha dinheiro para pagar as verbas. Pago os 2mil reais de multa só uma vez mais, e não todos os meses…

Dê baixa na carteira de trabalho dele, entregue o termo de rescisão para que ele possa sacar o FGTS, e as guias do seguro desemprego para que ele dê entrada. Mas pague apenas o que for possível, e o restante negocie.

Essa é outra lenda que escuto sempre: “a rescisão não pode ser parcelada!”. Quem disse? Claro que pode. Basta inserir, no termo de rescisão o valor da multa do 477, e pagar de acordo com as possibilidades da empresa. Melhor fazer isso do que não pagar, ou manter o funcionário sem precisar, só aumentando o problema…

Em relação às dívidas tributárias, vamos a alguns conceitos rápidos

Dívidas de tributos possuem uma multa absurda de 20%, e juros calculados pela taxa Selic. A taxa Selic é a menor possível. Não é possível pegar empréstimo em banco por uma taxa menor: é a taxa que remunera os títulos do governo; para ganhar Selic, ou menos do que isso, o banco emprestaria para o governo, com muito menos risco do que emprestar para qualquer empresa.

Então, para emprestar para quem não é governo, cobra-se uma taxa maior para compensar. No caso dos tributos, o problema é a multa de 20%, que somada à taxa Selic, faz com que o custo dessa dívida seja alto.

No entanto, a multa é fixa, e a taxa depende do prazo do atraso (vai se acumulando com o tempo). Por incrível que pareça, quanto mais tempo você ficar devendo, mais barata se torna a sua dívida. Se você atrasa 60 dias um tributo, vai pagar pouco mais de 20% de encargos, o que dá uma taxa média próxima de 10% ao mês. Já se atrasar 60 meses, esses 20% de multa vão se diluir no tempo, e a taxa média fica mais barata do que um financiamento bancário.

Claro que não estou incentivando ninguém a atrasar tributo. Mas se a empresa está em dificuldades, isso deve ser levado em conta. Precisando de uma certidão negativa nesse meio tempo, o jeito é pedir um parcelamento.

Se a cobrança se transformar em uma execução fiscal, vale lembrar que um parcelamento suspende o processo: melhor fazê-lo antes de qualquer penhora, assim o processo para sem que qualquer bem da empresa tenha sido gravado com ônus.

Em relação aos fornecedores, vale atentar para cobranças indevidas, tais como juros não pactuados, e honorários advocatícios em cobranças amigáveis. Quando a cobrança vem por intermédio de empresas especializadas, infelizmente, tais práticas são ainda mais comuns. Diante da insistência de tais cobranças, encaminhe o caso para o seu jurídico, ou peça a discriminação da cobrança por escrito.

Muitas outras práticas podem ser aplicadas para equalizar suas finanças. É preciso cabeça fria, e buscar conhecimento para sair da crise.

Considerações finais

Como disse, o objetivo foi dar uma ideia dos caminhos. Planejar a estratégia para lidar com tudo isso é o mais importante. E um ponto importante: nunca, jamais, feche a empresa informalmente, deixando os débitos sem controle.

Uma empresa informalmente encerrada é fraude, e faz com que a pessoa física dos sócios seja inserida nas ações movidas pelos credores.

Se a continuação for impossível, transfira a empresa para um endereço onde possa ser localizada – vale até a residência do sócio – e lá atenda a todos os oficiais de justiça. Mostre que não houve dissolução e que ninguém está se ocultando.

Com isso, os débitos se mantém em nome da pessoa jurídica, sem que sejam transferidos para os sócios – afinal, você vai precisar de tranquilidade para recomeçar o seu caminho.

PorAndrea Salles

Revisão de valores de locação em shoppings durante a pandemia

O alto custo da locação em shopping center sempre foi justificado pela grande circulação de pessoas nestes empreendimentos, trazendo ao locatário / lojista uma clientela ‘pronta’. Com isso, sempre foi de praxe a cobrança de aluguel percentual em torno de 7% do faturamento, mas com o pagamento de um aluguel mínimo fixado em contrato, 13º aluguel no mês dezembro, além de condomínio, ‘taxa’ de propaganda, entre outros encargos, em que os valores são geralmente corrigidos pelo IGPM. Isso sem contar que o locatário tem que pagar luvas (CDU), no início da locação.

Mas a pandemia mudou tudo isso… o fechamento dos shoppings gerou faturamento zerado dos seus lojistas. Mesmo após a abertura gradual do comércio, o que se viu foi … shopping vazios, lojas fechadas, faturamento muito menor do que o mesmo período no ano anterior. E a ‘ameaça’ constante de restrição de funcionamento – que acabou acontecendo em algumas cidades brasileiras no mês de março de 2021, tornou muito incerto o cenário futuro.

E toda essa crise trouxe consigo um verdadeiro cabo de guerra entre shoppings e seus lojistas, que acabaram recorrendo ao Judiciário, para tentar reequilibrar os contratos de locação e, em alguns casos, os contratos de CDU (luvas), já que esses contratos foram fortemente atingidos pela pandemia, que nada mais é do que uma força maior, capaz de possibilitar a revisão judicial destes contratos.

Se por um lado a crise atingiu a todos, é coerente que os prejuízos sejam partilhados, o que, por si só, permite a revisão contratual. Só que a briga vai além disso: não há mais a justificativa que permitia os altíssimos encargos destas locações: a clientela de antes não existe mais… e dizem os especialistas que ela foi definitivamente diminuída.

A partir disso, várias decisões passaram a determinar a redução dos custos destas locações no Judiciário, reduzindo o aluguel, condomínio, fundo de propaganda, afastando o 13º aluguel, além de reduzir a cobrança da CDU e alterar o índice de reajuste baseado em IGP, para índices mais próximos dos percentuais da inflação atual.

Sobre os contratos com reajuste pelos índices IGP, tais como o IGPM e IGP-DI, os respectivos percentuais simplesmente triplicaram em relação às medias anuais anteriores, por isso a revisão do índice também passou a ser objeto de discussão, para a substituição por um índice mais condizente com os níveis de inflação atuais.

Essas decisões, em geral, estão determinando uma redução temporária dos encargos, pelo período de duração da pandemia, já que o futuro dos contratos de locação em shopping center ainda está muito incerto. Por isso, o momento ainda é instável para pedidos de revisional de aluguel, já que nestes processos judiciais, a intenção é uma redução definitiva do valor do aluguel até o final do contrato locatício, havendo necessidade de perícia para constatação dos valores de mercado, o que torna o processo muito mais caro e arriscado.

A MSA advogados foi um dos primeiros escritórios a obter judicialmente a redução de aluguel de imóvel não residencial na capital fluminense, cuja decisão continua produzindo efeitos até agora (processo judicial nº 0095580-54.2020.8.19.0001). E continua obtendo decisões favoráveis, inclusive para a redução de CDU, como se vê nas decisões abaixo.
Assim, concede, este Juízo, parcialmente, a tutela provisória requerida para que sejam reduzidos os aluguéis mínimos, dos meses de abril a maio de 2020, em 50% e dos meses de junho a dezembro de 2020, em 20%, quando comércio, principalmente em shoppings, voltaram à sua normalidade, sem restrições de funcionamento. Quanto aos encargos condominiais, custos de ar-condicionado, de energia elétrica e parcelamento de cessão de direitos de integrar a estrutura do Barra Shopping, pelos mesmos motivos acima, devem ser reduzidos, nas mesmas proporções do aluguel mínimo, mas somente no período de 18/03/20 a 10/06/2020, inclusive os extremos, pois a partir de 11/06/2020, o Barra Shopping voltou a funcionar com todos os serviços relativos ao condomínio em si como limpeza, segurança, ar-condicionado, energia elétrica etc. Concede-se, aos Réus, prazo de 20 dias para implementarem as tutelas concedidas, com a apresentação à Autora de novos boletos de cobrança, na forma acima, corrigidos somente pela UFIR-RJ, sob pena de multa diária de R$500,00, ficando ciente, a Autora, de que, apresentados tais boletos, devem ser pagos de imediato, sob pena de cancelamento da tutela provisória. 3) Diante do comparecimento espontâneo dos Réus, desnecessárias as citações dos mesmos. 4) Intimem-se, os Réus, para ciência e cumprimento da tutela provisória, acima deferida. 5) Intime-se, a Autora, para aditar a Inicial (CPC, art. 303, § 1º, inc. I), em 15 dias.” (processo nº 0032650-55.2020.8.19.0209 – shopping na Barra da Tijuca)

Daí porque DEFIRO PARCIALMENTE a tutela, para: a) determinar a redução provisória em 50% do valor das cotas de condomínio (encargos comuns) até 03/2021; b) determinar a redução provisória em 70% do valor de fundo de promoção e propaganda até 03/2021; c) determinar a isenção provisória no pagamento do 13º aluguel; Intimem-se as partes, com urgência. Fica a parte ré autorizada a emitir regularmente os boletos, conforme requereu. Providencie o cartório a transferência dos valores de fls. 158/159, na forma em que foi requerida pelos réus às fls. 197. Intime-se a parte autora para eventual aditamento, como pugnou em sua petição. Após, a despeito da petição do index 175, os réus eventualmente terão nova oportunidade de apresentar contestação.” (processo nº 0039180-75.2020.8.19.0209 – shopping na Barra da Tijuca)

PorMarco Aurélio Medeiros

Eu acho que vi um Refis…

Há sempre um REFIS rondando por aí, e na pandemia a frequência aumentou.

Não há ainda um programa de refinanciamento federal aberto como os REFIS tradicionais, nos quais podem ser incluídos quaisquer débitos, em condições previstas em lei.

No entanto, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) tem publicado editais com condições para a adesão de contribuintes à transação tributária prevista na lei 13.988/2020, nos quais há a possibilidade de pagamentos de débitos com redução de multa e juros.

A diferença entre esses editais e os REFIS tradicionais são basicamente as seguintes: (i) a transação tributária está disponível apenas para débitos inscritos em dívida ativa, enquanto no REFIS qualquer débito pode ser incluído, (ii) os descontos nos editais dependem da condição de pagamento do contribuinte – a qual é avaliada pela própria PGFN –, enquanto nos REFIS estão previstos em lei e aplicáveis a todos indistintamente, e (iii) as regras dos editais são fixadas pela PGFN, enquanto no REFIS estão previstas em lei.

Em resumo, a diferença é grande… Mas enquanto um REFIS de verdade não vem (existe uma real possibilidade de acontecer), vamos nos contentando com as transações tributárias disponibilizadas pela PGFN.

Em 2020, tivemos as Portarias 14.402 (débitos em geral) e 18.731 (débitos do Simples Nacional), as quais tiveram prazo de adesão até o dia 29/12/2020.

Eis que foi publicada ontem (10.02.2021) a Portaria 1.696 trazendo as mesmas condições das Portarias acima mencionadas, especificamente para débitos constituídos no período de pandemia, ou seja, de março a dezembro de 2020.

Os débitos sofrerão uma classificação de acordo com o impacto sofrido pela empresa na pandemia. Quem vai definir esse impacto é a PGFN com as informações coletadas em seus sistemas, e, eventualmente, informações complementares solicitadas aos contribuintes. A quantidade de parcelas e o desconto vão variar de acordo com tal classificação, que será feita pela PGFN no momento da adesão.

As principais regras são:
• O prazo para pagamento vai de 36 a 133 parcelas. Quanto maior o parcelamento, menor o desconto.
• ME e EPP possuem descontos maiores e prazos idem.
• A entrada será de 4% do total do débito, parcelável em 12 meses.
• O prazo para opção vai de 1° de março a 30 de junho de 2021.

Confira a seguir detalhes do programa

Nas modalidades de quitação a entrada é sempre a mesma (12 parcelas de 0,334% do débito total), e o desconto de multa e juros sempre o mesmo (100%). O que muda é o limite do desconto de acordo com o número de parcelas. O desconto, apesar de ser inicialmente de 100%, está limitado a um percentual do débito total, de acordo com o número de parcelas. Nesse sentido, vejamos:

tabela 1

Como se viu acima, uma EPP pode parcelar em 36 vezes o débito com um desconto de 100% de multa e juros, desde que esse desconto fique em até 70% do saldo devedor inicial. Se o desconto for superior a esse patamar, será reduzido até alcançá-lo. À medida que o número de parcelas aumenta, reduz-se o limite do desconto.

As modalidades para as demais pessoas jurídicas são as seguintes:

tabela 2

Em se tratando das contribuições sociais previdenciárias, o prazo de parcelamento será de até 48 (quarenta e oito) meses.

Para empresas em recuperação judicial as modalidades são mais generosas, vejamos:

tabela 3

Como já informado, tudo isso está disponível apenas para débitos inscritos em dívida ativa. Para os contribuintes que possuam débitos não inscritos – sobretudo desse período recente de março a dezembro de 2020 –, o caminho é, antecipadamente, apresentar um requerimento na RFB para que o mesmo seja remetido para a PGFN para fins de inscrição em dívida. Uma vez inscritos, é possível aderir à transação.

Como se vê, não chega nem perto de ser um REFIS tradicional. Mas tem a vantagem de constantemente ser disponibilizado ao contribuinte em dificuldades.

PorMarco Aurélio Medeiros

“É impossível remar 24h por dia”

Todos conhecem Amir Klink. A frase utilizada no título acima é dele, dita do alto da experiência de quem saiu da Namíbia, na África, e cruzou 3,7 mil milhas em um barco a remo até a praia da Espera, perto de Salvador (Bahia), em 100 dias. A experiência se transformou no livro “Cem dias entre o céu e o mar”, um primor de leitura: agradável, divertida, inspiradora, e portadora de valiosas lições sobre planejamento e gerenciamento.

É isso mesmo: o sujeito remou da África ao Brasil no início dos anos 1980 sem qualquer ajuda, sem barco de apoio, sem monitoramento, sem nada que já não estivesse dentro do Paratii, o seu barco a remo.

Só de pensar, mil perguntas surgem na mente: quantas horas por dia remava? Como dormia? Como, e o quê comia? Quando dormia, o barco ia para onde? E se o barco virasse? E se entrasse na rota de um navio cargueiro enquanto estivesse dormindo? E se fosse abalroado por uma baleia? Se ficasse doente? Como atravessava aquelas tempestades no meio do oceano que jogam containers no mar? 

Para saber a resposta dessas e de outras perguntas, só lendo o livro. 

Mas a verdade incontestável é a de que não podia remar 24h por dia. Trazendo para o plano corporativo, é algo como “impossível jogar nas onze”. Ou ainda: “quando a cabeça não pensa, o corpo (ou o bolso, no caso das empresas) é que paga”. 

Sem equipe, sem plano, e sem ter gente contribuindo para o plano, o resultado redunda em naufrágio.

Amir Klink poderia ter feito o caminho de Serra Leoa ao Rio Grande do Norte em 1.500 milhas de águas quentes e tranquilas, mas preferiu fazer 3.700 milhas da Namíbia à Bahia, com tempo frio e mar agitado, porque a corrente era favorável. Assim, quando dormia e o barco ficava à deriva, não havia chance de retroceder de noite o que havia avançado de dia. Planejamento. Não deixou para pensar nisso dentro d’água, obviamente.

Se o barco virasse, automaticamente ele desvirava, como um boneco de João Bobo, graças ao projeto da embarcação localizando o centro de gravidade em um ponto estratégico. Planejamento, ajuda de gente que entende do assunto, e muitos testes antes de sair remando na costa africana.

E por incrível que pareça, muitos empresários e gestores ainda acreditam ser possível remar 24h por dia. 

Na linha do planejamento e equipe, Jim Collins, no seu “Empresas feitas para vencer”, traz um resultado interessante de sua pesquisa com empresas do grupo vencedor (histórico de valor de mercado bem acima da média) em comparação com o grupo de controle (as perdedoras): no lugar de pensarem o projeto estratégico, e depois buscarem pessoas certas para cada uma das posições do projeto, elas fazem o contrário: primeiro colocam as pessoas certas no barco, depois decidem para onde seguir.

E quem são as pessoas certas? São as que dispensam motivação externa, confiam na empresa, colocam os interesses da organização na frente dos seus – ou, se isso for pedir muito, pelo menos entendem que os seus objetivos só se concretizam se a empresa primeiro alcançar os dela.

Se um colaborador precisa ser motivado para produzir, esquece. Ninguém consegue estimular outra pessoa: motivação vem de dentro, não de fora. E o discurso de que “a motivação vem da crença no projeto”, para Jim Collins – e concordo com ele – é outra balela. Na verdade, um projeto pode até motivar, mas será um incentivo em bases frágeis: se trocar ou retroceder o projeto (e isso ocorre com frequência nas empresas, afinal, ninguém tem compromisso com o erro), o sujeito desanima.

Não é esse tipo de gente que queremos nas nossas empresas. A pessoa certa está sempre animada, qualquer que seja o projeto: ela acredita é na empresa, na sua cultura e nos seus valores, não nos bônus que receberá se bater as metas.

No Brasil da CLT e da justiça do trabalho, parece utopia. Mas convido ao exercício: olhe em volta, e estou certo de que na sua empresa já há, hoje, pessoas certas. Aquelas sempre motivadas, tentando melhorar e fazer o negócio andar independentemente de promessas, promoções ou bônus. 

Uma vez identificadas as pessoas certas, o exercício seguinte é multiplicá-las. Entendê-las, saber o que as trouxe até aqui, e sair em busca de gente com visão similar. E pare de tentar remar durante 24h do dia – inclua essas pessoas no projeto estratégico, planeje os próximos passos e, se não der certo, sem problema: senta com a turma de novo e muda o rumo, pois elas não vão desanimar por conta disso.

PorMarco Aurélio Medeiros

Tributação de lucros e dividendos: agora vai?

Infelizmente, parece que agora vai…

Feliz 2021!

A boca do Estado só aumenta: os penduricalhos fura-teto nos salários da aristocracia precisam ser quitados, a adega do STF com vinhos premiados tem que ser reposta, as lagostas na geladeira idem, aposentadorias, pensões, estatais deficitárias, ineficiências e todas as mazelas conhecidas… Alguém precisa pagar essa conta.

Por isso o ano já começa com más notícias em termos de tributos.

A reforma tributária é a meta do governo federal. Vende-se a ideia de simplificação de tributos e redução de custo.

A redução é mentira. A simplificação vai depender do que sair das Emendas Constitucionais e de seus regulamentos.

Não há qualquer redução de custo tributário no radar. O estado precisa arrecadar, muitas bocas para sustentar, não há como reduzir tributo sem reforma administrativa. E a tímida reforma administrativa na pauta não mexe com os funcionários públicos atuais: ou seja, daqui a uns 30 anos, se continuarem com o dever de casa (nada de contratar mais gente, criar estatais ou aumentar benefícios), talvez se consiga falar em reduzir tributo.

A tributação de dividendos (e distribuição de lucros) entrou definitivamente nos planos. Fala-se em reduzir alíquota do IRPJ para compensar. A troca é risível: reduzir a alíquota do IRPJ de 25% para 20%, e passa a tributar dividendo entre 15% e 20%.

Considerando que a CSLL é 9%, e que a base é a mesma, estaremos trocando uma tributação sobre o lucro hoje de 34%, por uma de 49% (somando a incidência na distribuição para o sócio/acionista).

Desde 1996, os lucros e dividendos creditados aos sócios de empresas no Brasil são isentos do pagamento de Imposto de Renda e de contribuições previdenciárias (INSS), por força do art. 10 da Lei 9.249/95. O intuito da lei – conforme descrito em sua exposição de motivos – foi concentrar a tributação na empresa. Com isso, simplifica-se a fiscalização.

E, de fato, em eras pretéritas existia uma tal “distribuição disfarçada de lucro”, que caiu em desuso. Com a distribuição de resultados tributada, muitas empresas assumiam as despesas dos sócios: empregados domésticos registrados no quadro de funcionários, veículos comprados em nome da empresa com os seus custos de manutenção idem, colégio lançado como treinamento, dentre outras inventividades. E o fisco, por sua vez, corria atrás dos artistas criativos identificando, a seu modo, o que podia e o que não podia ser pago pela empresa. Claro que, como é comum, o contribuinte abusa de um lado, e o fisco abusa (muito) do outro. Discussões intermináveis abarrotavam o então Conselho de Contribuintes (atual CARF) acerca do que se podia admitir como despesa da companhia, e o que não se podia.

Com a volta da tributação de dividendos, vamos ressuscitar todo esse contencioso.

Um dos supostos objetivos seria incentivar o investimento: com a tributação, teriam os investidores um motivo para, no lugar de retirar as riquezas produzidas, mantê-las no negócio. Outra balela.

Qualquer investidor, quando pensa em aplicar seu capital, faz a conta rentabilidade x risco: considerando o risco que é empreender no Brasil, o prêmio pago pelo investimento tem que superar com folga a tranquilidade de deixar o capital investido em títulos públicos ou outras aplicações de renda fixa – cujos juros hoje estão baixos, mas que tendem a subir já em 2021. Ao se tributar os lucros, o prêmio vai subir (visto que será reduzido da tributação), e, naturalmente, teremos menos investidores dispostos a tirar seu capital do Banco e colocá-lo no “fogo”.

Por “fogo”, entenda-se: gerar renda, empregos, pagar tributos, movimentar a economia, podendo perder tudo no final e ainda sair com umas ações trabalhistas de brinde…

Bradam os defensores de tal disparate que nos Estados Unidos, e em outros países desenvolvidos, os lucros são tributados. Contudo, internalizam só a metade das soluções de outros países. Esquecem-se que nos EUA a tributação sobre o resultado das empresas fica em aproximadamente 20% (contra 34% do Brasil), e a tributação sobre o consumo é da ordem de 7% (contra cerca de 30% daqui).

Fora que, nos EUA, a pessoa física pode deduzir quase todos os seus gastos pessoais antes de pagar o Imposto de Renda: ou seja, lucro ou outro rendimento, no fim do dia, tributa-se mesmo só o líquido. No Brasil, as únicas despesas realmente dedutíveis são as médicas: as demais possuem limites mínimos de dedução, os quais representam uma diminuta fração do gasto: resultado, tributação sobre o bruto.

Dificilmente vamos escapar dessa tributação em cascata. Quem puder, melhor já ir pensando nas alternativas e na adaptação possível ao negócio para essa provável nova realidade.

PorMarco Aurélio Medeiros

Regulamento do “novo Riolog”

A lei 9.025/2020, que trata de benefícios a atacadistas, tem sido chamada de “novo RIOLOG”, pois visa substituir a Lei 4.173/2003, batizada à época de RIOLOG. A lei dependia de regulamentação, o que ocorreu com a publicação de hoje (30 de dezembro) do Decreto 47.437/2020 no Diário Oficial .

Já escrevemos aqui nesse espaço sobre a Lei e os seus benefícios, o que pode ser acessado por esse link.

Sobre a regulamentação

A adesão ao benefício se dará na forma do Decreto 47.201/2020, ou seja, através de requerimento apresentado na CODIN, anexando carta consulta, todos os documentos relacionados no anexo único do Decreto, para posterior aprovação da Comissão de Políticas Públicas de Desenvolvimento do Estado (CPPDE).

Não existe previsão, no regulamento, de prazo para análise do pedido.

O Contrato Social do interessado em aderir somente poderá ter atividade atacadista, como determinado na lei, e o CNAE deverá estar limitado ao grupo 46.

Será previso pagar uma taxa de 1.000 Ufir (aproximadamente R$ 3,6 mil) para a Codin, e mais Taxa de Serviços Estaduais para a Fazenda.

Deve-se manter a arrecadação dos 12 meses anteriores ao protocolo: considera-se o ICMS recolhido, o ICMS importação, e o decreto incluiu ainda o FOT – algo que não estava na lei, a qual prevê apenas ICMS, e FOT, a rigor, não é ICMS. Assim, entendemos que o decreto extrapolou o previsto em lei, criando recolhimento mínimo de FOT além de ICMS. Tal ponto poderá ser objeto de discussões judiciais.

O contribuinte deverá comprovar a oferta anual de cursos de capacitação próprios ou terceirizados. O regulamento não fala em carga horária mínima ou qualquer outro requisito, de maneira que, na lacuna da norma, qualquer curso com qualquer carga horária será suficiente.

O regulamento estabelece ainda o modo pelo qual a manutenção do número de funcionários deverá ser comprovada: através da GFIP.

Em relação ao cálculo da ST, o regulamento segue a regra normal, determinando a aplicação do MVA sobre o valor de partida, que será o valor da nota fiscal de saída; além disso, será a ST calculada com base nas alíquotas previstas no art. 5° da lei (reduzidas) para as mercadorias do anexo único, e alíquota normal nos demais casos. E para os que tiverem mercadorias em estoque adquiridas com ST, deverão fazer um levantamento do valor já pago, e utilizá-lo na proporção de 1/12 no recolhimento da ST futura.

Os importadores e as centrais de distribuição ligadas a indústria deverão elaborar, até o dia 10 do mês subsequente, relatório contendo o valor das importações com as respectivas DI, e o valor das saídas com o imposto debitado, indicando em separado o das mercadorias importadas.

Os contribuintes optantes pelo regime do dec. 44.498/2013 poderão pedir migração automática para o novo regime no prazo de 90 dias contados da publicação do decreto; após esse prazo, eventual migração deverá ter o procedimento normal (requerimento na CODIN).

Novas adesões ao antigo RIOLOG (lei 4173/2003) e ao decreto 44.498/2013 estão proibidas. Quem já possui, poderá pedir a renovação até 29 de janeiro de 2021, e no caso de indeferimento, deverá ser recolhida a diferença de tributo em caso de o prazo do benefício ser ultrapassado.

A opção pela migração ou manutenção dos benefícios antigos deverá ser bem ponderada. Isso porque tanto o RIOLOG quanto o Decreto 44.498/201, podem ser mais benéficos para o contribuinte. No cálculo da ST, nos parece claro ser melhor o regime antigo. O problema é que a migração deve ocorrer de forma automática em 90 dias. Caso não se faça a migração, e se peça até janeiro de 2021 a renovação do antigo regime, eventual indeferimento causará dois efeitos:

(i) o novo benefício deverá ser requerido na CODIN (processo começando do zero: carta consulta, CPPDE etc.), e
(ii) em caso de a decisão administrativa de indeferimento se der em prazo superior ao fim da vigência do antigo regime, o contribuinte precisará recolher as diferenças.

Ou seja, a renovação somente deverá ser solicitada por aqueles que possuem a certeza do seu deferimento, o que, em última análise, é algo quase impossível de se obter, sobretudo na Fazenda do Estado do Rio de Janeiro.

PorMarco Aurélio Medeiros

Publicado o “Refis” fluminense

Foi publicado no Diário Oficial de hoje (29) a Lei Complementar n° 189 de 28/12/2020, que institui o programa especial de parcelamento de créditos tributários do Estado do Rio de Janeiro, com descontos de multas e juros para a quitação.

O citado REFIS estava autorizado pelo Convênio CONFAZ n° 87 de 02/09/2020, e estava aguardando a legislação local para ser instituído. Com a LC 189, abre-se a adesão ao parcelamento, medida muito esperada pelos contribuintes.

Podem ser parcelados débitos de ICMS cujo fato gerador tenha ocorrido até 31/08/2020.
Os descontos de multa e juros dependerão da quantidade de parcelas, obedecendo ao seguinte escalonamento:

I – em parcela única, com redução de 90% (noventa por cento) dos valores das penalidades legais e acréscimos moratórios;
II – em até 6 (seis) parcelas mensais e sucessivas, com redução de 80% (oitenta por cento) dos valores das penalidades legais e acréscimos moratórios;
III – em até 12 (doze) parcelas mensais e sucessivas, com redução de 70% (setenta por cento) dos valores das penalidades legais e acréscimos moratórios;
IV – em até 24 (vinte e quatro) parcelas mensais e sucessivas, com redução de 60% (sessenta por cento) dos valores das penalidades legais e acréscimos moratórios;
V – em até 36 (trinta e seis) parcelas mensais e sucessivas, com redução de até 50% (cinquenta por cento) dos valores das penalidades legais e acréscimos moratórios;
VI – em até 48 (quarenta e oito) parcelas mensais e sucessivas, com redução de 40% (quarenta por cento) dos valores das penalidades legais e acréscimos moratórios;
VII – em até 60 (sessenta) parcelas mensais e sucessivas, com redução de 30% (trinta por cento) dos valores das penalidades legais e acréscimos moratórios;

A Lei não trata do ICMS-ST, mas entendemos que deva ser incluído, pois se insere no conceito geral de débito de ICMS. A lei se estende ainda para débitos de IPVA e ITCMD.

A lei será regulada, de modo a serem previstos os procedimentos de adesão, cujo prazo é de 60 (sessenta) dias contados da presente data.

PorMarco Aurélio Medeiros

Afinal, pode distribuir lucros devendo tributos?

Empresas devedoras de tributos estão proibidas de distribuir lucros aos sócios, sob pena de pagar 50% do valor indevidamente distribuído a título de multa?

Será que existe defesa? Qual o risco em caso de distribuição?

O art. 32 da Lei n° 4.357/64 traz a proibição de que tratamos acima. Contudo, a vedação se dá tão somente para sociedades limitadas, enquanto nas sociedades anônimas a distribuição de dividendos é liberada, mesmo existindo dívidas tributárias.

Na Solução de Consulta n° 30, Cosit, de 27/03/2018, a Receita Federal do Brasil (RFB) posicionou-se no seguinte sentido: (i) confirmou o entendimento de que sociedades anônimas podem distribuir dividendos mesmo com dívidas, e (ii) entendeu que sociedades limitadas com débitos com exigibilidade suspensa (parcelados, garantidos por penhora, objeto de liminar etc.) podem, de igual modo, distribuir lucros.

Ou seja, a posição da RFB é de que sociedades limitadas com débitos não garantidos estão impedidas de realizar a distribuição, sob pena de incorrer na malfadada multa de 50%.

Na prática, contudo, vemos diversas sociedades limitadas distribuindo lucros, mesmo carregando débitos tributários. E de outro modo não se poderia exigir, visto que a grande maioria das empresas no Brasil é formada por micro e pequenas (ME/EPP), das quais depende o sustento de seus sócios. Nesse sentido, a OAB nacional possui uma ação direta de inconstitucionalidade de 2014 (ADI n° 5161) arguindo a validade do art. 32 da Lei n° 4.357/64, sob o argumento de que tal dispositivo fere o princípio da livre iniciativa, insculpido no art. 170 da Constituição Federal. Tal ação tem a relatoria do Ministro Roberto Barroso e, na presente data, o processo encontra-se com o mesmo para despacho desde 12/12/2016.

Vale dizer que o mesmo art. 32 também trazia vedação à distribuição de dividendos nas S/A, mas o seu texto foi vetado pelo então presidente Castelo Branco, justamente sob o fundamento de que feria a livre iniciativa. Ora, não há porque diferenciar o regime de distribuição de resultados das sociedades anônimas e do regime das sociedades limitadas. Razão pela qual há grandes chances de êxito na ADI da OAB.

A RFB tem fácil acesso às empresas que realizam distribuições (informadas na DIRF) ao mesmo tempo em que mantém débitos: um simples cruzamento de seus sistemas é capaz de elaborar um rol de devedoras distribuindo lucros. Mesmo assim, não se vê um movimento no sentido de coibir ou penalizar a prática, ao menos de forma ostensiva. Muito provavelmente por conta da situação controversa acima demonstrada. Contudo, não se pode descartar uma mudança de procedimento, ou a autuação por agente fiscal em procedimento rotineiro e individualizado de fiscalização.

Havendo a autuação, o caminho será a impugnação em processo administrativo, e posteriormente – se for o caso – judicial, com grandes chances de êxito. Até o julgamento da ADI, entretanto, será sempre um risco, ainda que calculado.

PorMarco Aurélio Medeiros

Recebi uma cartinha da Receita Federal, e agora?

Qualquer correspondência da Receita Federal do Brasil (RFB) tem o poder de causar pânico em muitos contribuintes.

Quando não é débito, é fiscalização. Por mais que nada se tenha a temer, fiscalização sempre representa, no mínimo, perda de tempo e energia. 

Em tempos de pandemia, poucas empresas estão livres de dívidas com o fisco, e é nesse momento que têm chegado as cartinhas da RFB e da Procuradoria avisando da existência de débitos tributários, sugerindo a quitação ou parcelamento, sob pena de inscrição em dívida ativa.

Os optantes pelo Simples Nacional temem ser excluídos. Confundem essa comunicação com a notificação de exclusão do sistema por débito. Os demais contribuintes, com a cobrança, ligam de imediato aos seus contadores perguntando o quê fazer.

A resposta é simples: tais comunicados não alteram em nada a estratégia de gestão do caixa do contribuinte até aqui.

Para os optantes pelo Simples Nacional, o Ministério da Economia (ao qual a RFB está subordinada) já se manifestou informando que em 2020 não haverá exclusão de contribuintes do sistema por conta de débitos. Assim, tais cartas de cobrança não significam exclusão.

E para os contribuintes em geral, a carta de cobrança, por si só, não traz qualquer adversidade. Não significa que uma fiscalização será disparada em sequência, ou que a execução fiscal será ajuizada no dia seguinte.

Então, nada vai acontecer? 

Vejamos abaixo de forma detalhada os efeitos dos valores em aberto de tributos federais.

Atraso curto x atraso longo

Já tivemos oportunidade de escrever a respeito: os encargos incidentes sobre os tributos incentivam o contribuinte a atrasar o pagamento por longos prazos, e não o contrário.

A multa por atraso é de 0,33% ao dia, limitada a 20%. Ou seja, em 60 dias a multa alcança o seu valor máximo de 20%. Depois disso, a multa não cresce mais, e sobre o débito incide apenas os juros, calculados com base na taxa Selic (hoje em 2% ao ano).

Vejam o contrassenso: o atraso por até 60 dias impõe uma multa de 20% (que significa uma taxa composta de 9,55% ao mês). Se esse atraso for de 60 meses, e não de 60 dias, a multa estacionada em 20% passa a representar uma taxa composta de 0,3% ao mês.

Como os juros são baixos (2% ao ano, que representa uma taxa composta de 0,17% ao mês), um atraso de 60 meses vai importar em um pagamento de juros mensais de 0,47% (0,3 + 0,17), enquanto um atraso de 60 dias significa uma despesa mensal de juros de 9,72% (9,55 + 0,17). Resumindo, fica assim:

tabela multa

Em síntese: financeiramente, se for para atrasar o pagamento do tributo, não faz sentido atrasar por pouco tempo, mas pelo maior prazo possível. 

Naturalmente que existem outros efeitos decorrentes do atraso: impossibilidade de emissão de certidões, proibição de distribuição de lucros, fora o risco de protesto, o que prejudica o crédito. Nesses casos, o parcelamento – segundo as premissas acima – faz mais sentido do que uma eventual quitação em parcela única dos valores atrasados.

Inscrição em dívida ativa

Em determinado momento a dívida será inscrita em dívida ativa. O que é isso? Quais os efeitos daí decorrentes?

A inscrição em dívida ativa tem a finalidade de formalizar o título executivo (certidão da dívida ativa – CDA) através do qual a Fazenda poderá iniciar a execução fiscal.

Um efeito indesejado da inscrição em dívida é o acréscimo de encargos de 10% ao valor do débito no momento em que o mesmo é inscrito, de acordo com o previsto no art. 37-A da Lei n° 10.522/2002, cumulado com art. 3° do Decreto-Lei 1.569/77.

Uma vez inscrito, a dívida poderá ser executada. Mas isso não ocorre de imediato. Em regra, são executados débitos vencidos há pelo menos quatro anos, dado que a prescrição da Fazenda para cobrá-los é de cinco anos contados do vencimento.

Parcelamento

O parcelamento ordinário está acessível a qualquer contribuinte, podendo o débito ser quitado em até 60 meses, respeitada a parcela mínima estipulada de acordo com o porte da empresa.

Os parcelamentos especiais com prazos maiores e abatimento de multa e juros dependem de leis específicas, e nem sempre estão disponíveis.

Para os optantes pelo Simples, o regime do parcelamento recebeu algumas modificações.

Até 31/10/2020, o contribuinte estava limitado à formalização de apenas 1 (um) pedido de parcelamento do Simples Nacional por ano-calendário. A partir de 01/11/2020, passou a ser admitida a formalização de mais de 1 (um) pedido de parcelamento do Simples Nacional por ano-calendário. A possibilidade de reparcelamento se deu com publicação da Instrução Normativa RFB nº 1.981, de 09/10/2020, que alterou a Instrução Normativa RFB nº 1.508, de 04/11/2014.

E no que se refere à multa por atraso, a qual tem um valor diário até alcançar o seu limite em 60 dias, em caso de parcelamento, qualquer que seja o tempo de atraso (ou seja, mesmo inferior aos 60 dias), aplica-se o valor máximo de 20%.

Exclusão do Simples Nacional

A exclusão do Simples Nacional em 2020, como vimos, não vai ocorrer. 

No entanto, prevê a lei que a exclusão por existência de débitos somente ocorre depois de notificado o contribuinte. Tal comunicação deve ser específica: não resolve notificar tão somente a existência de débitos. 

O contribuinte será notificado especificamente, com a indicação de que em 30 dias será excluído por ser devedor da Fazenda Nacional. Em que pese a exclusão no prazo citado, a mesma só produzirá efeitos a partir do ano calendário subsequente. 

No mesmo prazo de 30 dias poderá o contribuinte quitar ou parcelar os valores evitando a exclusão. 

E ainda, mesmo que ela ocorra, como produz efeitos apenas a partir do ano subsequente, é possível, até 31 de janeiro, quitar ou parcelar os débitos e solicitar a reinclusão no sistema. Com isso, apesar da exclusão anterior, a nova inclusão ocorrerá em sequência, de modo que, na prática, a empresa estará todo o tempo recolhendo seus tributos dentro da sistemática simplificada.