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Afinal, pode distribuir lucros devendo tributos?

PorMarco Aurélio Medeiros

Afinal, pode distribuir lucros devendo tributos?

Empresas devedoras de tributos estão proibidas de distribuir lucros aos sócios, sob pena de pagar 50% do valor indevidamente distribuído a título de multa?

Será que existe defesa? Qual o risco em caso de distribuição?

O art. 32 da Lei n° 4.357/64 traz a proibição de que tratamos acima. Contudo, a vedação se dá tão somente para sociedades limitadas, enquanto nas sociedades anônimas a distribuição de dividendos é liberada, mesmo existindo dívidas tributárias.

Na Solução de Consulta n° 30, Cosit, de 27/03/2018, a Receita Federal do Brasil (RFB) posicionou-se no seguinte sentido: (i) confirmou o entendimento de que sociedades anônimas podem distribuir dividendos mesmo com dívidas, e (ii) entendeu que sociedades limitadas com débitos com exigibilidade suspensa (parcelados, garantidos por penhora, objeto de liminar etc.) podem, de igual modo, distribuir lucros.

Ou seja, a posição da RFB é de que sociedades limitadas com débitos não garantidos estão impedidas de realizar a distribuição, sob pena de incorrer na malfadada multa de 50%.

Na prática, contudo, vemos diversas sociedades limitadas distribuindo lucros, mesmo carregando débitos tributários. E de outro modo não se poderia exigir, visto que a grande maioria das empresas no Brasil é formada por micro e pequenas (ME/EPP), das quais depende o sustento de seus sócios. Nesse sentido, a OAB nacional possui uma ação direta de inconstitucionalidade de 2014 (ADI n° 5161) arguindo a validade do art. 32 da Lei n° 4.357/64, sob o argumento de que tal dispositivo fere o princípio da livre iniciativa, insculpido no art. 170 da Constituição Federal. Tal ação tem a relatoria do Ministro Roberto Barroso e, na presente data, o processo encontra-se com o mesmo para despacho desde 12/12/2016.

Vale dizer que o mesmo art. 32 também trazia vedação à distribuição de dividendos nas S/A, mas o seu texto foi vetado pelo então presidente Castelo Branco, justamente sob o fundamento de que feria a livre iniciativa. Ora, não há porque diferenciar o regime de distribuição de resultados das sociedades anônimas e do regime das sociedades limitadas. Razão pela qual há grandes chances de êxito na ADI da OAB.

A RFB tem fácil acesso às empresas que realizam distribuições (informadas na DIRF) ao mesmo tempo em que mantém débitos: um simples cruzamento de seus sistemas é capaz de elaborar um rol de devedoras distribuindo lucros. Mesmo assim, não se vê um movimento no sentido de coibir ou penalizar a prática, ao menos de forma ostensiva. Muito provavelmente por conta da situação controversa acima demonstrada. Contudo, não se pode descartar uma mudança de procedimento, ou a autuação por agente fiscal em procedimento rotineiro e individualizado de fiscalização.

Havendo a autuação, o caminho será a impugnação em processo administrativo, e posteriormente – se for o caso – judicial, com grandes chances de êxito. Até o julgamento da ADI, entretanto, será sempre um risco, ainda que calculado.

Sobre o autor

Marco Aurélio Medeiros editor

(marco@advmsa.com.br) é advogado pós-graduado em Direto da Economia e da Empresa e em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas – FGV e Mestre em Contabilidade Tributária pela FUCAPE/RJ. Ex-professor de Direito Empresarial da Universidade Estácio de Sá e ex-auditor do Tribunal de Justiça Desportiva do Rio de Janeiro. É sócio da MSA Advogados e atua nas áreas de planejamento tributário e empresarial.

11 Comentários até agora

JUNANDIR DA COSTA DIASPublicado em9:12 am - abr 1, 2021

Bom dia, tenho uma empresa com divida não tributaria multa de importação, posso distribuir lucro? haja vista conforme frisei não é débito tributário.

    MSA AdvogadosPublicado em12:33 pm - abr 5, 2021

    A vedação para distribuição encontra-se no art. 32 da Lei 4357/64, que possui a seguinte redação, com o nosso grifo:
    Art 32. As pessoas jurídicas, enquanto estiverem em débito, não garantido, para com a União e suas autarquias de Previdência e Assistência Social, por falta de recolhimento de impôsto, taxa ou contribuição, no prazo legal, não poderão:
    a) distribuir … (VETADO) … quaisquer bonificações a seus acionistas;
    b) dar ou atribuir participação de lucros a seus sócios ou quotistas, bem como a seus diretores e demais membros de órgãos dirigentes, fiscais ou consultivos;

    Assim, tendo o débito outra natureza que não a acima indicada, inexiste vedação legal à distribuição de lucros.

carolinaPublicado em2:55 pm - abr 27, 2021

A empresa que eu trabalho vem acumulando prejuízo desde 2018. Porem nesse primeiro trimestre, deu lucro, não estamos devendo impostos, simplesmente não tivemos lucro nos anos anteriores… esse prejuízo é considerado uma divida? e não podemos dividir o lucro desse trimestre por conta desse prejuízo?

    MSA AdvogadosPublicado em5:22 pm - maio 7, 2021

    Somente é possível distribuir lucros se a empresa tiver lucros. Caso o lucro atual não suplante o prejuízo acumulado, no final a empresa continuará tendo prejuízo acumulado, menor, mais ainda prejuízo. Uma forma de distribuir lucro, caso a empresa tenha um capital alto, é reduzir o capital para absorver prejuízos, de modo que o lucro atual não seja suplantado.

LeandroPublicado em11:07 am - maio 24, 2021

Prezado bom dia!

Tenho escrituração de um MEI (Micro empreendedor Inividual, ele tem um funcionário, não recolheu o DAS referente o exercicio de 2020, e nem o INSS comp. 10,11 e 12/2020, como o artigo trata de Sociedade Limitada, ele teve um lucro de líquido de R$ 33.000,00 em 2020, porém por dever INSS e DAS posso fazer a distribuição ou deixo em lucros acumulados até ele quitar a dívida de impostos?

    MSA AdvogadosPublicado em11:26 am - maio 24, 2021

    A rigor, pelo que entende o fisco, somente seria possível distribuir lucros com os tributos quitados. Entendo que essa regra é inconstitucional, e há decisões favoráveis na justiça. Mas é bom alertar o cliente que ele corre o risco de ser autuado.

      LeandroPublicado em12:42 pm - maio 24, 2021

      Muito obrigado pela resposta, então pelo que eu entendi, mesmo sendo MEI, ele não pode distribuir lucros devido os impostos estarem em abertos, vou fechar o balanço e deixar o resultado em lucros a distribuir e assim que o cliente quitar sua dívida de impostos farei a distribuição para evitar problemas com o fisco.

Rubens Galvão de OliveiraPublicado em11:40 am - mar 21, 2023

Dr. Marco Aurélio.
As empresas de pequeno porte em geral, fazem retiradas no decorrer do ano para suas c/c de pessoa física. Normalmente já informados deste risco. Entendo que através das transferências bancárias realizadas, as distribuições já foram efetivadas. Neste caso, seria melhor não liberar o informe de rendimento quando solicitado pelo cliente? Uma dúvida, pois o fato já cois consumado pelas transferências bancárias p/ c/c do(s) sócio(s).

    MSA AdvogadosPublicado em4:46 pm - mar 21, 2023

    A transferência deve ser lançada na contabilidade como adiantamento, ou como mútuo. Há decisões do CARF no sentido de que o adiantamento de lucros, enquanto os mesmos não são distribuídos, configuram-se como mútuo, sendo devido o IOF. A dúvida então não é se entrega o informe, mas se lança como lucro distribuído ou não. Se não lançar, permanecerá o mútuo. Se lançar, corre o risco da imposição da multa de 50%. É um risco que o cliente, e não o contador, deve tomar – daí a decisão ser dele.

SIRLEY QUEIROZ NUNESPublicado em10:14 am - maio 6, 2024

Olá, e o AUMENTO DE CAPITAL SOCIAL da empresa, pode ser aumentado utilizando AS RESERVAS DE LUCROS E/OU LUCROS ACUMULADOS? mesmo que possua DIVIDA TRIBUTÁRIA ATIVA ou NÃO??

    MSA AdvogadosPublicado em4:05 pm - maio 6, 2024

    Quando se integraliza capital com lucros, a participação do sócio fica majorada, ou seja, é atribuída ao sócio uma parte dos lucros da sociedade. Nesse sentido, é possível interpretar que tal movimento seria uma infração ao artigo 32 da Lei 4.357/64.

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