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O que sobrou da Tese do Século?

PorMarco Aurélio Medeiros

O que sobrou da Tese do Século?

Cliente: “Amaury, nós já estamos pagando o PIS e o COFINS com desconto?

Contador: “Sim, desde a decisão do STF já estamos apurando com essa redução. Mas vocês ainda não acertaram a informação no xml… Estamos fazendo ajustes na EFD, o que não é bom.

Cliente: “Realmente, você tinha me falado. Mas precisa vir alguém seu aqui resolver isso para mim… E o que pagamos a mais para trás? Vamos conseguir recuperar?

Contador: “Dá para fazer, mas precisa retificar quase os últimos 5 anos de DCTF e EFD. Estou levantando o custo disso para lhe passar.

Cliente: “Ué, já não pago a contabilidade todo mês? Isso é cobrado por fora?

Contador: “Claro, é retrabalho…

Cliente: “Mas não fui eu que causei o retrabalho. Entendo que acertar algo que estava errado é obrigação do contador!

Quem nunca?…

Em geral, o cliente entende que naqueles honorários mensais pagos ao contador está tudo incluído: do vigésimo recálculo de DARFs atrasados que nunca são pagos, ao e-social da empregada doméstica, passando por preencher o formulário de cadastro do Banco.

A chamada “tese do século”, a exclusão do ICMS da base do PIS/COFINS, foi definitivamente julgada pelo STF em maio/2021, deixando bastante trabalho para os contadores – que, para variar, alguns clientes entendem incluído no pagamento mensal.

Há contadores ainda com dúvidas, sobretudo em relação aos clientes que não entraram com a ação: posso fazer a exclusão sem processo judicial? Consigo recuperar o retroativo administrativamente? A resposta é positiva para ambas as perguntas, mas valem certos cuidados, e também a reflexão sobre o melhor caminho para a recuperação do retroativo.

Exclusão sem ação judicial

O STF entendeu que o ICMS não integra a base do PIS e da COFINS; além disso, entendeu ser o ICMS destacado na nota fiscal, não o recolhido. Com isso, a apuração desses tributos já pode ser feita com a referida exclusão desde a competência maio/2021, sem necessidade de qualquer ação judicial.

Alertamos que a informação da exclusão deve constar já na emissão da nota fiscal. Apesar de não aparecer no DANFE, o xml tem campo próprio para carregar essa informação em cada item da NF. Com isso, no momento de importar as informações do xml para a EFD, o valor a ser excluído já vem demonstrado, e a apuração é feita corretamente.

Meu cliente não acertou o xml, e agora? Não posso excluir?

Pode excluir. Mas nesse caso, será necessária a utilização do campo de ajustes da EFD. Ou seja, faz-se a exclusão por fora, e lança-se o valor diretamente no campo próprio da EFD. Não é o ideal, mas dá para fazer.

Dois problemas dessa prática: (i) o lançamento da redução de tributo em razão da exclusão é lançado sem qualquer demonstração – o que pode motivar a RFB a conferi-lo em procedimento de fiscalização –, e (ii) há espaço para erros, pois existem produtos sem tributação de ICMS, mas tributados por PIS/COFINS, ou tributados por esses e não por aqueles; se o trabalho não é feito item a item, fica aberta a possibilidade de inconsistências.

De qualquer modo, tem que excluir, pois ninguém quer (ou deve) pagar tributos indevidamente. Assim, seja com certos no xml, seja lançando diretamente na EFD, todos os contribuintes podem apurar desde maio/2021 o PIS/COFINS excluindo o valor do ICMS de sua base de cálculo, mesmo aqueles que não ajuizaram ações.

Recuperação do valor pago a maior

E o que fazer com o valor pago a maior nos últimos cinco anos?

A decisão do STF modulou os efeitos de março/2017 em diante. Isso significa que dessa data para cá, todo o valor pago a maior pode ser recuperado pelos contribuintes.

É possível recuperar sem ação judicial, mas não recomendamos. Explico.

A recuperação sem ação judicial deve obedecer ao seguinte cronograma:

  • Retificação das EFDs de todo o período;
  • Retificação das DCTFs de todo o período;
  • Com a redução dos débitos, levantamento dos valores pagos a maior em cada DARF pago no período;
  • Realização de uma PER/DCOMP para cada DARF no qual foram realizados pagamentos a maior.

Além de todo o trabalho de retificação, temos alguns outros inconvenientes aí.

Primeiro, toda retificação importa na interrupção da prescrição. Ou seja, a retificação, em 2021, da EFD de abril/2017, fará com que os tributos lançados naquela época, prestes a prescrever em 2022, possam ser fiscalizados até 2026. Sem mencionar que a retificação de dezenas de declarações de uma só vez será um convite ao fisco para que venha conferir o procedimento.

Mais do que isso: com a retificação da EFD, o fisco poderá conferir não só a efetiva exclusão do ICMS, mas toda a apuração daquela competência, dado que os prazos de prescrição foram reiniciados.

Por fim, um complicador de ordem prática: em caso de retificadoras, serão criados vários créditos por pagamento de DARF recolhido a maior. Logo, deverá ser feita uma DCOMP para cada DARF. Se para quitar um débito recente, for preciso utilizar créditos de vários DARFs, serão várias DCOMPs para cada débito.

Pode-se evitar todo esse périplo através de um procedimento simples na justiça

Como a questão está decidida, todos os juízes decidirão de maneira uniforme, e de acordo com o direcionamento do STF. Assim, um mandado de segurança buscando tão somente a declaração de que o contribuinte possui o crédito e pode compensá-lo extrajudicialmente é suficiente.

Com a decisão judicial, faz-se o levantamento do crédito, a habilitação desse crédito na RFB de acordo com o artigo 100 da IN RFB n° 1.717/2017, a qual deve ser decidida em 30 dias de acordo com o §3° desse mesmo artigo, e a partir daí já podem ser realizadas as compensações mensais via PER/DCOMP.

Como será a compensação de um único valor de crédito reconhecido judicialmente, podem ser incluídos vários débitos em uma única PER/DCOMP. E como inexistem retificadoras a fazer, não há reinício de prazos de prescrição. A Fazenda poderá tão somente checar se o valor do ICMS excluído nos cálculos habilitados está correto, mas não reabrir a revisão da apuração de PIS/COFINS de anos atrás.

Parecer da PGFN

A Procuradoria da Fazenda Nacional se posicionou sobre o tema no Parecer SEI n° 7.698/2021/ME, recomendando que os Auditores da Fazenda Nacional não lavrem mais autuações em razão tanto da exclusão na apuração, quanto no procedimento de recuperação dos créditos existentes de março/2017 em diante.

Com isso, ficam validados os procedimentos de recuperação para os contribuintes que não acionaram o judiciário, como dissemos acima.

Sobre o autor

Marco Aurélio Medeiros editor

(marco@advmsa.com.br) é advogado pós-graduado em Direto da Economia e da Empresa e em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas – FGV e Mestre em Contabilidade Tributária pela FUCAPE/RJ. Ex-professor de Direito Empresarial da Universidade Estácio de Sá e ex-auditor do Tribunal de Justiça Desportiva do Rio de Janeiro. É sócio da MSA Advogados e atua nas áreas de planejamento tributário e empresarial.

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