Esse artigo comenta sobre as justificativas geralmente aceitas sobre indenização por rescisão imotivada do contrato, considerando os contratos de colaboração que são aqueles em que um dos contratantes se compromete a criar ou até mesmo consolidar o mercado para o produto do outro, como por exemplo contrato mercantil, colaboração por aproximação, mandato, representação comercial, entre outros.
Considerando esses tipos de contratos e seguindo jurisprudências já aceitas nos tribunais, podemos observar alguns pontos quando da rescisão imotivada do contrato:
Verifica-se que progressivamente a jurisprudência vem observando a função social do contrato e a boa-fé que deve reger todas as relações. Sendo assim, não se atém somente ao que foi estabelecido entre as partes, transcendendo o que está nas cláusulas contratuais para se chegar a uma decisão mais justa.
Como parâmetro ao que foi mencionado acima, cita-se a decisão do STJ:
“O STJ decidiu o seguinte: “CONTRATANTE DEVE INDENIZAR EMPRESAS CONTRATADAS POR RESILIÇÃO UNILATERAL ANTES DA RECUPERAÇÃO DO INVESTIMENTO” (precedente: REsp 1.555.202 / REsp 1.874.358)”
Analisando o teor da decisão verifica-se que mesmo sendo uma rescisão unilateral lícita, que respeitou as cláusulas estabelecidas no contrato, ainda assim, julgou-se no sentido de condenar pelos danos materiais decorrentes da denúncia do contrato, uma vez que o entendimento foi no sentido de que a rescisão imotivada não teria respeitado “um prazo razoável para recuperação do investimento realizado pela outra parte para o cumprimento das obrigações assumidas no contrato.”
Em outras palavras, buscou-se um equilíbrio contratual, afastando o pactuado, com a finalidade de gerar uma função econômica, analisando, assim, os impactos negativos que essa rescisão poderia gerar na empresa, que teve que fazer um forte investimento para cumprir o contrato, prestigiando, assim, o princípio da preservação da empresa.
Seguindo o mesmo caminho do que foi decidido acima, há uma notícia no site do STJ com o seguinte título: “Partes de contrato devem observar rescisão unilateral responsável”. Nesta matéria é ratificado que ainda que o contrato contenha cláusulas que permitam a rescisão unilateral, esta deve ser feita de maneira responsável, observando a boa-fé, a finalidade social do contrato e ainda o investimento realizado para o cumprimento do acordo. Abaixo, uma parte do texto da notícia:
“Não se trata, é bom que se diga, da assunção, por uma das partes, dos infortúnios que porventura sejam experimentados pela outra, por quaisquer razões, pela influência de quaisquer elementos. A responsabilidade que se atribui ao contratante que se utilizada da faculdade de romper o pacto diz respeito apenas aos danos experimentados pelo contratante diretamente ligados ao fato de não mais subsistir o que fora avençado, quando as condições da avença apontavam para destino diametralmente diverso”, afirmou em seu voto o relator, ministro Luis Felipe Salomão. O recurso julgado pelo STJ teve origem em ação indenizatória proposta por empresa de cobrança contra diversas instituições de financiamento e arrendamento mercantil, sob a alegação de que a empresa, após contrato firmado com as instituições, teria feito grandes investimentos para atender a demanda pactuada. Contudo, após 11 meses de vigência, a empresa foi informada de que o contrato seria rescindido de forma unilateral, pois não atendia mais os interesses das instituições financeiras.” (https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias-antigas/2016/2016-12-22_08-11_Partes-de-contrato-devem-observar-rescisao-unilateral-responsavel.aspx)
Observamos pelas decisões mencionadas, que há uma verdadeira intervenção do estado, ultrapassando até mesmo o princípio do pacta sun servanda, com a finalidade de “afastar em parte” o pactuado em nome da função social dos contratos, da boa-fé objetiva e até mesmo do princípio da preservação da empresa.
Em uma verdadeira balança de princípios, pesa aquele que tem uma função social e pensando desta forma a preservação da empresa tem um peso social muito mais amplo do que fazer valer realmente o que foi pactuado entre as partes.
O que foi feito através da decisão acima mencionada foi analisar os impactos que essa rescisão imotivada (e legal) traria para a empresa que investiu valores para cumprir o aludido contrato.
Quanto ao princípio da preservação da empresa, é importante ressaltar que atualmente, tanto a doutrina quanto a jurisprudência, inclusive do STJ, vêm buscando soluções mais consentâneas segundo os preceitos da constituição no que tangem a ordem econômica e que, objetivam a preservação das empresas e suas unidades produtivas, com fulcro no que determina a constituição Federal em seu artigo 1º, inciso IV:
“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
IV – Os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; ”
Em suma, o princípio da preservação da empresa, busca, basicamente, a manutenção da unidade produtora, com evidente estímulo à atividade empresarial, com vistas a promover sua função social, assumindo uma feição pública de relevante interesse social. Nesse mesmo sentido, Fábio Ulhoa Coelho tem o seguinte posicionamento:
“(…) no princípio da preservação da empresa, construído pelo moderno Direito Comercial, o valor básico prestigiado é o da conservação da atividade (e não do empresário, do estabelecimento ou de uma sociedade), em virtude da imensa gama de interesses que transcendem os dos donos do negócio e gravitam em torno da continuidade deste; (…)” (COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de direito comercial: direito de empresa. 20. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 13.)
Assim, a empresa é vista como uma unidade econômica básica da livre iniciativa, como um dos pilares da economia, prestigiando-se, assim, sua função social, uma vez que representa uma fonte geradora de empregos e riquezas, além de ocupar importante posição frente ao Fisco (recolhimento de tributos).
Veja que a questão é muito mais ampla do que parece, iniciamos falando sobre a função social do contrato, e estamos elaborando um outro prisma discorrendo sobre o princípio da preservação da empresa, visto que estão intimamente ligados, já que, se o judiciário se mantivesse distante destas questões, muitas empresas, certamente, teriam suas atividades encerradas frente à contratos que inviabilizariam sua continuidade.
Assim é que, a conservação da atividade empresarial é um interesse social devido a sua capacidade econômica beneficiando: credores; empregados, em razão dos seus postos de trabalho; consumidores, no que se refere a bens e serviços; Fisco, em virtude da arrecadação de tributos; dentre outros tantos que podemos citar.
Apesar dos aspectos já citados, ainda se verifica alguns entendimentos em sentido contrário, com prevalência do que foi pactuado entre as partes, ressaltando o seguinte:
Cito trechos do acórdão (e-STJ, fl. 1.162):
“Tendo o contrato prazo certo (24 meses), deveria fazer parte do planejamento empresarial da sociedade autora a elaboração de preço que, no período previsto, fosse suficiente à recuperação do investimento e ainda à obtenção de lucro. Se não o fez, quiçá com a intenção de se tornar mais competitiva, não pode imputar à ré assunção desse risco, ou mesmo eventual falha em sua estratégia empresarial. Por essa razão é que improcede tanto a pretensão de indenização pelo investimento realizado quanto o pedido de indenização suplementar. Cabe à autora, como se verá adiante, apenas a indenização prevista no art. 603 do Código Civil. Consigna-se, nessa oportunidade, que, embora as partes houvessem pactuado que o contrato se renovaria por prazo indeterminado, certo é que a condição estabelecida no instrumento, ou seja, o termo final do acordo, não se operou. Não se aplica, portanto, o disposto no art. 473, parágrafo único, do Código Civil, de aplicação exclusiva às hipóteses de contrato por prazo indeterminado. Dessa forma, desinfluente se revela, para fins de apuração do montante indenizatório, a previsão de que o contrato futuro (que não foi celebrado) seria por prazo indeterminado.”
Por todo o exposto, verifica-se que há decisões divergentes sobre o tema. Por outro lado, conforme decisões colacionadas, há uma grande tendência do STJ em se posicionar pela função social do contrato e intervir, em alguns casos, no que foi pactuado entre as partes, trazendo um maior equilíbrio contratual e primando pelo princípio da preservação da empresa.
A resposta é SIM!
A Lei 14.133/2021 foi publicada em 01/01/2021 e entrou em vigor na data de sua publicação, conforme determinado em seu artigo 194. Outrossim, o Artigo 193 menciona que “REVOGAM-SE” as leis anteriores através de 2 incisos, senão vejamos:
Art. 193. Revogam-se:
I – os arts. 89 a 108 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, na data de publicação desta Lei;
II – a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, a Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002, e os arts. 1º a 47-A da Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011, após decorridos 2 (dois) anos da publicação oficial desta Lei.
Diante do mencionado artigo, verifica-se que os artigos 89 a 108 foram revogados na data da publicação da lei, não podendo mais serem utilizados a partir de então; enquanto a lei 8.666, a lei 10.520 e os artigos arts. 1º a 47-A da Lei nº 12.462, permanecem em vigor até 01/04/2023.
Diante do que foi determinado acima, a maior dúvida é: já que a nova lei já entrou em vigor e a lei anterior (8.666/93) permanecerá em vigor por dois anos, qual a lei deveremos utilizar?
A partir da análise supracitada, significa dizer que teremos a Lei 14.133 e as leis citadas no inciso II do artigo 193, convivendo, juntas, por 2 anos, até a revogação que cita o mencionado artigo.
A nova Lei de licitações ainda depende de ser regulamentada para algumas questões. Assim, ainda que esteja em vigor, algumas modalidades ainda não estão regulamentadas na nova legislação.
Desta forma, até a revogação da Lei 8.666/93 em 2023 a Administração poderá escolher qual das duas leis pretende utilizar no certame. Sendo certo que a opção escolhida deverá ser expressa no edital.
Outro ponto importante a ser considerado é que ao optar por uma das duas leis, a Administração não poderá fazer uso da outra lei, já que é vedada a aplicação combinada, com fulcro no que determina o artigo 191:
Art. 191. Até o decurso do prazo de que trata o inciso II docaputdo art. 193, a Administração poderá optar por licitar ou contratar diretamente de acordo com esta Lei ou de acordo com as leis citadas no referido inciso, e a opção escolhida deverá ser indicada expressamente no edital ou no aviso ou instrumento de contratação direta, vedada a aplicação combinada desta Lei com as citadas no referido inciso.
Registra-se ainda que qualquer contrato que tenha sido assinado antes da entrada em vigor da Lei 14.133/93, continuará a ser regido pela legislação anterior, primando, assim, pela segurança jurídica, já que uma lei não pode retroagir para prejudicar um ato jurídico perfeito:
Art. 190. O contrato cujo instrumento tenha sido assinado antes da entrada em vigor desta Lei continuará a ser regido de acordo com as regras previstas na legislação revogada.
Parágrafo único. Na hipótese docaputdeste artigo, se a Administração optar por licitar de acordo com as leis citadas no inciso II docaputdo art. 193 desta Lei, o contrato respectivo será regido pelas regras nelas previstas durante toda a sua vigência.
Reparem que o parágrafo único do artigo 190 menciona que se a legislação optar pela utilização da antiga lei o contrato será regido por aquela durante toda sua vigência. Isso quer dizer que: ainda que o contrato ultrapasse a data de 01/04/2023 (que é a data da revogação da lei 8.666/93), ainda assim, o respectivo contrato será regido pela Lei revogada.
Por toda narrativa acima, conclui-se que a partir do dia 01/04/2021 a Administração passou a ter a opção de utilizar a lei anterior ou a nova lei, mas uma vez escolhida a legislação a ser seguida, não poderá haver uma combinação entre elas, bem como o contrato advindo deste certame terá que seguir a lei que foi determinada no edital.
Em época de Covid-19 a regra é simplificar para minimizar os prejuízos causados pela pandemia, sendo esta regra aplicada principalmente à administração pública, onde diversos mecanismos foram criados ou adaptados para diminuir a burocracia, antes tão necessária para coibir fraudes.
Um destes mecanismos foi a criação da Lei Federal 13.979/2020, alterada pela Medida Provisória 926/2020, que dispõe sobre “as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019”.
A citada Lei, com a intenção de acelerar a contratação pela administração pública e com a finalidade de atender às necessidades sociais advindas da pandemia, trouxe o artigo 4º, que instituiu mais uma forma de dispensa de licitação, determinando que “é dispensável a licitação para aquisição de bens, serviços, inclusive de engenharia, e insumos destinados ao enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus de que trata esta Lei. ”
Observamos que a dispensa de licitação de que trata a lei é destinada a qualquer ente público, que tenha como finalidade adquirir bens ou serviços relacionados à emergência de saúde pública em decorrência da pandemia; além de ser temporária, pois só pode ser utilizada enquanto perdurar esta situação, como indica o inciso 1º do mencionado artigo.
Neste sentido, com base no artigo 4º-B, nas dispensas de licitação decorrentes desta Lei, presumem-se atendidas as condições de:
Outras questões importantes a serem levantadas é a falta de exigência de estudos preliminares quando se tratar de bens e serviços comuns (artigo 4º-C), assim como a redução pela metade dos prazos dos procedimentos licitatórios, caso o órgão opte por fazer pregão eletrônico ou presencial, com objetos necessários ao enfrentamento de que trata esta Lei (artigo 4º-G).
Apesar dessa simplificação, é importante ressaltar que as estimativas de preços devem seguir os parâmetros previstos pelo artigo 4-E, inciso VI, que são:
Ainda com relação à estimativa de preços, em casos excepcionais e com a devida justificativa da autoridade competente, esta pode ser dispensada (artigo 4º-E, §2º).
No que tange aos contratos regidos por esta Lei, terão duração de 6 meses, podendo ser prorrogados por períodos sucessivos, enquanto perdurar a necessidade de enfrentamento dos efeitos da situação de emergência de saúde pública, de acordo com o artigo 4 – H.
Outro ponto importantíssimo é a imposição trazida pelo artigo 4º- I, que prevê nos contratos de que trata esta lei que “a administração pública poderá prever que os contratados fiquem obrigados a aceitar, nas mesmas condições contratuais, acréscimos ou supressões ao objeto contratado, em até cinquenta por cento do valor inicial atualizado do contrato.”. Explicando, o artigo prevê que a empresa contratada está obrigada a aceitar acréscimos ou supressões impostas pela Administração Pública enquanto durar o estado de necessidade ocasionado pelo coronavírus.
Conclui-se, portanto, que essa legislação, em seu artigo 4º, objetivou acelerar as contratações por parte da administração pública, dispensando certas formalidades que certamente retardariam e por consequência tornariam a compra ineficaz, flexibilizando, assim, as regras da Lei 8.666/93, como forma de se adequar ao cenário atual.
Por fim, ainda que se considere a finalidade de celeridade do procedimento, com a dispensa de licitação, é importante que as empresas contratadas, bem como a própria Administração Pública, tenham ciência de que não estão livres de passarem por auditorias, caso seja verificada qualquer tipo de fraude, devendo tomar as devidas cautelas, zelando sempre pela boa-fé contratual e pelo próprio erário.