A pandemia do novo coronavírus, o Covid-19, atingiu em cheio o já precário sistema de saúde brasileiro, provocando a superlotação dos hospitais, a falta de equipamentos e testes e, como consequência, milhares de mortes. No entanto, a Covid-19 não causou impacto apenas na área da saúde, mas também na economia, tendo em vista que várias empresas de diferentes atividades foram obrigadas a fechar suas portas.
Até mesmo os negócios que permaneceram abertos sofreram grande redução no seu faturamento, pois a quarentena e o isolamento social fizeram com que as pessoas circulassem menos e reduzissem o seu consumo. Com exceção de algumas empresas ligadas as áreas de saúde e tecnologia da informação, os outros setores foram muito afetados. Sendo assim, a grande maioria das lojas que continuaram abertas na pandemia, como mercados e farmácias, têm sofrido um forte impacto.
No entanto, apesar da forte queda do faturamento das empresas brasileiras, as contas permanecem chegando, como água, luz, gás, telefone, condomínio e aluguel. Grande parte das empresas alugam o local em que desenvolvem as suas atividades (escritórios, galpão ou fábrica) e essas passaram a procurar os proprietários dos imóveis para negociar desconto durante esse período de pandemia. Mas, nem todos os proprietários têm agido de maneira compreensiva, o que muitas vezes provoca a necessidade de ajuizamento de ação judicial por parte do inquilino.
Foi o que ocorreu no processo ajuizado pela MSA Advogados, em nome de um dos seus clientes, no qual foi requerida a redução do aluguel em 50% (cinquenta por cento) durante a pandemia, e que foi deferido pela Juíza da 24ª Vara Cível da Comarca da Capital – RJ.
Em sua decisão, a Juíza ressaltou que a pandemia do coronavírus diz respeito a fato de natureza imprevisível e extraordinária, razão pela qual constitui caso de força maior, o que justifica a renegociação das cláusulas contratuais, conforme abaixo:
“E, em razão da natureza imprevisível e extraordinária, é possível, como requerido pelo autor, a renegociação das cláusulas contratuais. Frise-se que nenhuma das partes tem responsabilidade sobre o ocorrido; a hipótese é de fato imprevisível e completamente alheio à vontade das mesmas, nos exatos termos do art. 393, Código Civil.
(…)
As bases fáticas sobre as quais o contrato foi ajustado, sem dúvida, sofreram alterações por força de fato extraordinário e imprevisível – pandemia da COVID-19; razão pela qual é possível a revisão pretendida, durante o período, de forma temporária. Daí a probabilidade do direito.”
A decisão ressaltou, ainda, a importância da solidariedade entre as partes nesse momento, de modo que ambas devem dividir as perdas decorrentes da pandemia, não podendo todo o prejuízo recair sobre uma das partes:
“Deve-se ter em mente, ao menos por ora, durante a pandemia, que deve haver solidariedade de perdas. As partes contratantes, dentro da boa-fé contratual, deverão negociar as perdas de cada uma. Demonstra o autor que a ré se recusa a negociar, assumindo posição de total indiferença à situação extraordinária e imprevisível que se instalou, conforme documento de fls. 47.”
Dessa forma, foi deferida a liminar requerida, determinando a redução do aluguel comercial em 50% até o fim da suspensão de abertura do comércio, devendo o réu emitir o boleto do respectivo aluguel já com o desconto previsto da decisão judicial.
O nº do processo que resultou nessa decisão é o 0095580-54.2020.8.19.0001.
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O mundo inteiro foi fortemente abalado pela pandemia do coronavírus, a qual vem causando, além da superlotação dos hospitais, o fechamento de diversas empresas e o aumento do desemprego, o que tem afetado significativamente a economia nacional.
Dessa forma, por se tratar de situação que obviamente se enquadra na categoria de força maior, a pandemia autoriza a renegociação de contratos, por meio de descontos e parcelamentos dos pagamentos, em função da impossibilidade de arcar com as obrigações na forma em que foram pactuadas antes da pandemia.
No entanto, muitas pessoas têm se aproveitado da atual situação para justificar inadimplementos indevidos, como nos contratos firmados após a instauração da pandemia e nos casos em que já existiam descumprimentos anteriores à essa.
Ora, se o contrato foi firmado após a transmissão comunitária no país, o que ocorreu no dia 20/03/2020, segundo o Ministério da Saúde, tendo as partes acordado acerca do cumprimento de suas obrigações, não se mostra razoável que uma delas alegue que foi surpreendida ou mesmo que se trata de fato imprevisível, uma vez que a pandemia já era um fato notório quando as obrigações foram pactuadas.
Além disso, se já existiam descumprimentos anteriores à instauração da pandemia, essa não pode ser utilizada como justificativa para pleitear a renegociação do contrato, uma vez que o pacto já não vinha sendo cumprido antes mesmo do coronavírus.
Sendo assim, as renegociações realizadas em função da Covid-19 devem ser pautadas na boa-fé e no bom senso entre as partes, razão pela qual a pandemia não deve ser utilizada como argumento para levar vantagem sobre o outro.
No entanto, situações como essa são propícias para que pessoas de má-fé se aproveitem e tomem atitudes levianas, o que só contribui para o agravamento da crise e torna ainda mais difícil a sua superação.
Logo, atitudes oportunistas devem ser combatidas, razão pela qual as partes devem agir com bom senso, de acordo com a boa-fé e a cooperação, de modo que a renegociação deve servir para tornar possível o adimplemento das obrigações e permitir a manutenção dos contratos, e não para que uma parte leve vantagem em relação à outra.
Dessa forma, assim como não é razoável que uma parte se negue a renegociar um contrato pactuado antes da pandemia, também não se mostra correto que a outra parte se utilize da pandemia para levar injustificadas vantagens em detrimento do outro, tendo em vista que o oportunismo só contribuirá para que o buraco causado por essa crise seja ainda mais fundo.